quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Crítica: "Um Estado de Liberdade"

Um Estado de Liberdade
(Free State of Jones)
Data de Estreia no Brasil: 17/11/2016
Direção: Gary Ross
Distribuição: Paris Filmes


          A Guerra de Secessão é um dos pontos que sempre recebem enorme atenção quando se aborda a história dos Estados Unidos. Entretanto, há uma grande distância entre as discussões que fazemos sobre o tema em um ambiente historiográfico e as percepções do senso comum. Uma das primeiras noções que abordamos é a de que a chamada Guerra Civil envolveu muito mais questões do que um lado "bom" dos abolicionistas da União e o lado do "mau" dos confederados escravistas. Este é justamente um dos maiores acertos de "Um Estado de Liberdade". Ao contar a história (baseada em registros históricos) de um ex-capitão confederado que deserda a guerra o filme consegue explorar as questões de um ponto de vista mais "externo" ao conflito, abordando o sofrimento da população e de pessoas comuns ao invés de focar suas atenções em um dos lados do conflito.


         Newton Knight é um enfermeiro que decide abandonar os confederados e se unir à escravos fugidos em um pântano perto de sua cidade de origem. Perseguido pelas tropas que o pretendem enforcar como um desertor, Knight consegue atrair para seu grupo um número cada vez maior de soldados desiludidos com a guerra e seus avanços, o que obviamente culmina em confrontos armados. Apesar do que a breve sinopse pode indicar, não se iluda: "Um Estado de Liberdade" não é um épico de guerra. Os esforços do filme não estão voltados para construir grandiosas cenas de combates entre os dois lados ou um heroismo glorificado envolvendo a figura de Knight e seus companheiros. O filme dirigido por Gary Ross é sobretudo um drama, que explora o cenário de um país mergulhado em Guerra Civil, buscando discutir temáticas mais gerais como por exemplo a exploração e opressão da elite em relação à população, obrigando o povo a lutar uma guerra em seu lugar e para defender seus interesses. 
       A abertura do filme é significativa neste sentido, uma vez que mostra Newt recebendo um ofício dos confederados declarando que o proprietário de mais de 40 escravos está automaticamente dispensado da guerra. A escravidão em si é também um dos pontos-chave da narrativa de "Um Estado de Liberdade", encaixando-se na temática maior de opressão que o filme discute. É aí que entra também um dos maiores problemas apresentados pelo filme. "Um Estado de Liberdade" é o tipo de filme que almeja mais do que tem real condições de atingir. Sobra ambição e falta organização, resultando em um produto final completamente sem ritmo e arrastado que acaba por virar uma bagunça na sala de edição. Vários elementos abordados pelo filme dariam por si só uma história inteiramente nova. Lembro-me principalmente de "Um Ato de Liberdade" (2008), que com uma trama semelhante e quase exatamente a mesma duração, consegue ser muito mais conciso em seus objetivos e apresentar um produto final mais coeso (apesar de não ser nenhuma obra-prima). Ao invés de focar-se nos rebeldes e suas batalhas, "Um Estado de Liberdade" almeja algo mais grandioso, um estilo de "drama épico" que Paul Thomas Anderson e Martin Scorsese fazem também. O problema é que Gary Ross é um diretor inexperiente e não chega nem perto da qualidade dos diretores citados acima, acabando por perder o controle sobre sua obra. A ambição irrealista do projeto acaba por "esticar" demais a trama, tornando seus elementos bastante rasos ao invés de focar em alguns e explorá-los de maneira mais satisfatória. 
         No entanto, há ainda muito o que aproveitar em "Um Estado de Liberdade". Ao atirar para todos os lados o filme consegue vários acertos, construindo em sua narrativa uma série de personagens e momentos que tem muito a dizer ao espectador. Matthew McConaughey é um excelente ator e consegue conferir grande profundidade a seu personagem, criando um Newton Knight que, por suas próprias características altruístas, acaba por tornar-se um grande vetor entre o público que assiste o filme e o sofrimento das pessoas com quem entrou em contato durante sua vida. A performance do ator não é, contanto, boa o suficiente para considerá-lo novamente a uma indicação ao Oscar. Com a exceção do sempre ótimo Mahershala Ali como o liberto Moses, não há nenhum outro grande destaque no quesito atuação. 
         No aspecto mais técnico considero a direção de Gary Ross bastante competente, com uma câmera dinâmica que enfoca e segue sempre seus personagens, evitando de maneira inteligente planos estáticos e muito abertos. Ross conduz com qualidade as poucas cenas envolvendo conflitos abertos da Guerra, criando uma sensação de claustrofobia e desespero frente a uma morte quase certa. A cinematografia é também ótima e rende algumas cenas belíssimas, principalmente as que envolvem cenários naturais, como por exemplo o pântano que desempanha papel importante na trama. O aspecto que mais me agradou e chamou a atenção em "Um Estado de Liberdade" é sua trilha sonora. O diferencial aqui é que o silêncio é muito bem utilizado, fazendo com que a trilha sonora não seja invasiva quando utilizada e apareça nos momentos mais necessários, com um muito apropriado tom "folk" que combina com a narrativa e a engrandece.
     Gosto muito também das discussões envolvendo questões segregacionistas, que aparecem com frequência no filme e são majoritariamente tratadas com justiça e levantam questões muito pertinentes. Estas discussões, no entanto, sofrem também com o problema crônico deste filme. Enquanto algumas cenas envolvendo a Ku Klux Klan parecem absolutamente deslocadas, há ainda sequências que se passam na década de 40 e conseguem ser ainda mais deslocadas, surgindo arbitrariamente na metade da narrativa. Por conta disso, apesar de terem o potencial para constituir algo interessante, estas cenas acabam por "sobrar" e mais atrapalham do que ajudam. De maneira geral, esta parece ser a sina que prejudica e persegue "Um Estado de Liberdade": um filme que se recusa a limitar seu escopo de ambições e sofre por conta disso, insistindo numa tentativa fracassada de dar um passo maior do que as próprias pernas.







Bom

Por Obi-Wan

Um comentário:

  1. O êxito do filme se deve muito ao grande elenco que é bastante conhecido pelo seu grande trabalho. Matthew McConaughey esta impecável no filme Um Estado de Liberdade. Ele sempre surpreende com os seus papeis, pois se mete de cabeça nas suas atuações e contagia profundamente a todos com as suas emoções. Adoro porque sua atuação não é forçada em absoluto. Seguramente o êxito de ator Matthew McConaughey deve-se a auas expressões faciais, movimentos, a maneira como chora, ri, ama, tudo parece puramente genuíno. Este ator nos deixa outro projeto de qualidade, de todas as suas filmografias essa é a que eu mais gostei, acho que deve ser a grande variedade de talentos. A fotografia é impecável, ao igual que a edição. Sem dúvida voltaria a ver este filme!

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