sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Crítica: "Hell or High Water" ("A Qualquer Custo")

A Qualquer Custo
(Hell or High Water)
Data de Estreia no Brasil: 05/01/2016
Direção: David Mackenzie
Distribuição: CBS Films


        A expressão em inglês "come hell or high water" traduziria-se para o português em algo semelhante à "custe o que custar". Há também um termo chamado cláusula "hell or high water" em contratos bancários, indicando que o credor deve pagar o que deve ao banco sob qualquer circunstância. Dessa forma, apesar de a tradução brasileira ("A Qualquer Custo") fazer jus ao conteúdo do filme, não chega aos pés da genialidade do título original, que explica de uma vez só os dois principais elementos da trama do filme e da jornada da familha Howard. O filho mais novo Toby é um texano divorciado que não consegue pagar a pensão alimentícia de seus filhos. Já seu irmão Tanner passou 10 anos na prisão e foi recém liberado. A narrativa do filme se desenrola a partir da decisão tomada pelos dois de roubar pequenos bancos da região Oeste do Texas para pagar a hipoteca que sua falecida mãe havia feito no rancho da família.
           O roteiro elaborado pelo novato Taylor Sheridan (responsável também por escrever o excelente "Sicario") é praticamente perfeito no cumprimento de seus objetivos. A maneira escolhida por "Hell or High Water" para contar sua história é certamente a mais impecável do ano até o momento. O filme serve como comprovação de duas premissa essenciais em termos cinematográficos: o cinema nunca deve contar uma história, mas mostrá-la; é possível abordar temas extremamente complexos e grandiosos a partir de histórias aparentemente simples e contidas. É partindo destes princípios que "Hell or High Water" não desperdiça um segundo sequer de seu tempo de exibição e proporciona uma das melhores e mais completas experiências cinematográficas de 2016.
         Com poucos personagens e uma estrutura narrativa muito dinâmica e concisa, o filme dirigido por David Maclkenzie é minimalista e minucioso. Nenhum diálogo é desperdiçado com qualquer tipo de exposição da trama ao público. Ao invés disso, somos levados a constituir mentalmente a história a partir de conversas e ações dos personagens que soam naturais nas situações em que estão inseridos. Outro ponto de grande destaque em "Hell or High Water" é sua edição. A montagem/edição de um filme é um aspecto fundamental do cinema e um que pouco percebemos conscientemente, mas que é responsável por determinar em grande parte como reagimos a um filme. Neste caso, a edição é construída de forma a se encaixar perfeitamente com o minimalismo proposto pelo roteiro, não deixando que nenhuma cena se alongue mais do que deveria e assim conferindo ao filme uma enorme dinamicidade em seu ritmo.
           As atuações em "Hell or High Water" também beiram a perfeição. A dinâmica fraternal entre Chris Pine e Ben Foster é bem construída ao ponto de os dois dependerem muito pouco de diálogos para impregnar na mente do espectador uma imagem de sua personalidade e da natureza de sua relação. Ambos certamente merecem uma indicação ao Oscar de melhor ator em 2017 por sua incrível capacidade de dizer muito em poucas palavras. Outro que merece novamente ser lembrado pela Academia é Jeff Bridges, que interpreta de maneira impecável o melancólico xerife Marcus Hamilton, personagem muito semelhante ao policial interpretado por Tommy Lee Jones em "Onde os Fracos não Têm Vez" (2007). Aliás, as semelhanças deste em relação ao magistral filme dos irmãos Coen vão além de um só personagem. Em essência, ambos são westerns modernos, no sentido em que usam uma paisagem abandonada para expor na tela uma história de desolação. No entanto, "Hell or High Water" é muito mais western do que o filme sobre  o serial killer Anton Chigurh.
        Justifico: "Hell or Hihg Water" faz constantes referências às principais temáticas do gênero, explorando em uma tela de cinema de 2016 como tudo mudou, sem que nada tenha de fato se transformado. Desde vaqueiros tentando salvar seu rebanho de um fogo que ninguém apagará até um policial indígena lidando com o racismo, somos levados por uma paleta de cores amarelada e pela contemplativa câmera de David Mackenzie a explorar os aspectos da vida moderna no antigo meio-oeste americano. "Hell or High Water" é um filme direcionado inteiramente a seus personagens, mas não só aos mostrados em tela. Estes servem como meros vetores que representam algo muito maior e mais amplo. A tagline que pode ser vista no poster do filme embaixo do título ("a justiça não é um crime") resume de maneira perfeita a principal temática desta obra-prima de Mackenzie: a (in)justiça social.


Excelente

Por Obi-Wan

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