terça-feira, 26 de abril de 2016

Crítica: "Ave, César!"

Ave, César!
(Hail, Caesar!)

Comédia/Mistério
Data de Estreia no Brasil:14/04/2016
Direção: Joel Coen e Ethan Coen
Distribuição: Universal Pictures


“Ave, César!” é uma obra estranha, com uma proposta irreverente e um senso de humor peculiar diferente da maioria das obras estadunidenses. Em outras palavras, é um bom filme dos irmãos Coen. Mais uma vez subvertendo gêneros cinematográficos e trabalhando em uma linha tênue entre a sátira e a homenagem ao mundo da indústria do cinema dos anos 50, o novo filme da famosa dupla de cineastas trás nas entrelinhas qualidades técnicas e temáticas acima da média no cinema moderno, mas uma estrutura que deixa a desejar em relação à obra completa dos irmãos.
Partindo de um roteiro e montagem sem foco narrativo algum (pontos que abordarei melhor mais a frente) o filme basicamente conta a história de Edward Mannix (Josh Brolin) um funcionário da Capitol Pictures que possui a função de resolver os problemas das estrelas de seu estúdio (protegendo-as de escândalos e traçando estratégias para “melhorar” suas imagens quanto ao público). Eis que uma das maiores estrelas da empresa, Baird Whitlock (George Clooney), é seqüestrada e cabe a Mannix trabalhar para recuperar seu astro enquanto mais e mais problemas vão surgindo ao longo do dia.
No decorrer da história, a “gramática” do filme aposta numa montagem (feita pelos próprios Coen, como de costume) em tons episódicos e totalmente dispersos no filme. A grande maioria dos personagens possui duas cenas para apresentar uma problemática na primeira e “resolve-la” na segunda, assemelhando o filme quase que a um “Road movie”, no qual os personagens surgem, interagem com o protagonista e vão embora após servirem ao seu propósito. De fato este é um elemento de subversão de gênero tão clássico na filmografia dos irmãos Coen e que aqui, embora bem executado, soa sempre muito divagante.
Parecendo se divertir imensamente ao retratar a linguagem dos filmes da velha Hollywood, a criatividade dos Coen alça vôo na medida com que estes devem lidar com construções de cenas de westerns, filmes “bíblicos” e musicais que perpassam pelo filme sempre com um tom de ironia tão marcante dos irmãos. Assim, a metalinguagem do filme ganha novas proporções a cada nova produção da Capitol Pictures que somos apresentados, dando espaço para que ainda os diretores se divirtam com o próprio filme ao colocar personagens agindo de forma cartunesca (com suas reações e com a forma “peculiar” de Mannix correr), ou mesmo numa cena na qual dois personagens cantam em meio a um jantar sem motivo aparente algum (exatamente como aconteceria num musical).
Aliás, para que tal linguagem complexa funcione dentro da projeção, a direção de arte e a fotografia do mestre Roger Deakins tem importância máxima. Deakins utiliza luz e sombras para dramatizar perfeitamente o momento (como de hábito), manipulando ainda lentes grandes e abertas e usando brilhantemente uma paleta de cores quentes que não só casa bem com o tom dramático forçado do filme, como também ainda representa certa doçura e homenagem ao período. A direção de arte, por outro lado, ajuda diretamente a proposta dos diretores nas mudanças de gêneros cinematográficos - Por exemplo, quando vemos uma Roma distante avistada por um exército, a imagem que temos parece amadora para os dias atuais, mas perfeita para os padrões das produções do período.
É interessante pensar como que os aspectos técnicos possuem todos sua funcionalidade, ainda que rendendo certa irregularidade também ao filme. Isto se deve ao fato de ficar claro ao longo da projeção que os Coen deliberadamente sacrificaram qualquer foco narrativo e estrutural de roteiro para apresentar um verdadeiro caos no dia do protagonista, em meio a tantos problemas, bem como para servir à uma análise macro estrutural, já que embora sejam “dramas” de indivíduos que vemos em diversos pontos da projeção, estes estão diretamente calcados na industria do cinema estadunidense em suas características como um todo. Até mesmo a certa “organização” por trás do sequestro de Baird Whitlock está ligada a tal perspectiva – E não direi mais nada para não estragar a divertida surpresa e desenvolvimento deste ponto da projeção. Assim, não posso dizer foi um erro tal decisão “anti-estrutural” dos produtores, mas é inegável o fato de que a falta de uma coesão narrativa mais palpável torna o filme mais maçante, com esta decisão não funcionando tão bem como em “O Grande Lebowski”, por exemplo.
Além disso, não há qualquer desenvolvimento de personagem em um arco estabelecido (algo que claramente, volto a frisar, é proposital), não que isto afete o elenco estelar, pois este não deixa a desejar demonstrando caracterizações divertidas. Na verdade, este é outro aspecto que tem funcionalidade no filme, mas com certas ressalvas: enquanto Ralph Fiennes, Scarlett Johansson, Shanning Tatum e Tilda Swinton atuam de maneira extremamente divertida e até mesmo caricata (algo que funciona bem dentro do tom da “narrativa”), seus personagens foram escritos em referências a outros artistas reais dos anos 50 como Laurence Olivier e Gene Kelly, tornando-se muito mais divertido para o espectador que consegue identificar tais referências, restringindo um pouco a comédia do filme que já não é muito abrangente.
No fim das contas, cabe mesmo a Josh Brolin e George Clooney protagonizarem os melhores momentos do longa. Enquanto o primeiro demonstra perfeita segurança para guiar o filme como seu protagonista sempre atarefado, de fala rápida, inteligente e metódico, Clooney demonstra uma falta de egocentrismo tremenda ao servir ao filme quando este necessita de sua presença de cena forte, mas não busca chamar a atenção a qualquer custo, numa composição corajosa de um verdadeiro astro de Hollywood. Aliás, é este clima de colaboração mutua e perfeita ciência do resultado almejado que torna “Ave, César!” um filme tão divertido e interessante. Porém, por mais que a execução da proposta seja perfeita, para atingi-la sacrificam-se aspectos narrativos básicos e importantes.







Bom
Por Han Solo






Nenhum comentário:

Postar um comentário