sexta-feira, 22 de abril de 2016

O porquê amamos cinema: "Purple Rain"


Por: Clóvis Gruner

        Nasci e cresci no interior, e nas décadas de 1970 e 80 isso significava uma relação problemática com o cinema. Minha cidade natal, Joinville,por exemplo, tinha dois cinemas somente, e isso até 1983, quando um incêndio destruiu o Cine Colon, restando apenas a gigantesca sala do Cine Palácio, vendido em 1995 para a Igreja Universal. No primeiro, assistia uma exibição comemorativa de “Branca de Neve e os sete anões”. No segundo, “ET, o extraterrestre” quando, por volta de 1983, o filme passou por Joinville.

      Isso era bastante comum também: além de poucas salas, os cinemas do interior amargavam uma longa espera, não raro um ano ou mais até, para que um filme estreasse por lá. Para um adolescente, isso podia significar meses de uma angústia interminável, especialmente se o filme ansiosamente aguardado havia arrebatado multidões em salas americanas e europeias e repetia a trajetória de sucesso nos cinemas das grandes cidades brasileiras.
        Mas aconteceu: em algum momento de 1985 ou 1986 (não lembro ao certo), circulou a notícia que “Purple Rain”, o filme estrelado por Prince, entraria em cartaz no Cine Palácio. Eu já sabia algo sobre ele, porque provavelmente li a respeito nos jornais ou, mais provavelmente, em alguma revista de cultura pop da época. Conhecia a carreira de Prince de alguns clipes exibidos no “Fantástico” domingo à noite e das “matinés” de domingo à tarde, onde dançávamos ao som de “Whendovescry” e “Raspberryberet”.
        Mas “Purple Rain” prometia elevar essa experiência a um outro patamar, ao menos para mim, um adolescente mergulhado em crises mais ou menos típicas da idade: não era apenas um clip nem o som mecânico das danceterias. Era Prince na tela gigante do Palácio, com sua musicalidade, sua androginia, seu estrelato. Disputei um ingresso com uma fila de outros adolescentes e jovens que, como eu, pressentiam que aquela não seria uma sessão qualquer, mas um verdadeiro acontecimento. E foi.
      Levei anos para perceber a importância de Prince e de “Purple Rain” na minha adolescência. Com o tempo, deixei de acompanhar a carreira do artista e apenas muito raramente revi o filme. Mas nesta semana, com o seu desaparecimento, me dei conta de que, ao menos para mim, assisti-lo naquele momento da minha vida foi extremamente significativo. Prince e “Purple Rain” não resolveram nenhuma das minhas crises. Mas me ajudaram a perceber que era possível ser diferente e sobreviver a isso. E quando se é adolescente, isso já é muita coisa

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