Drama/Música
Data de Exibição: 14/02/2016 a17/04/2016
Canal de Exibição: Home Box Office (HBO)
Produção: Rich Coen, Mick Jagger, Martin Scorcese, Terrence Winter
Mais um exemplo de algo que se torna cada vez mais comum na indústria do entretenimento, "Vinyl" surgiu primeiramente como um projeto para o cinema. Se pararmos para pensar, faz todo o sentido: Martin Scosese, um enorme fã dos Rolling Stones e do Rock n' Roll dos anos 70 em geral, produzindo juntamente com Mick Jagger um filme sobre o cenário da música e da indústria das gravadoras na Nova York de meados dos anos 1970. Ou seja: sexo, drogas e Rock n' Roll. Não há nenhum cenário possível e imaginável em que isso teria alguma chance de dar errado. Porém, com o amadurecimento do projeto, Scorsese e o vocalista dos Stones provavelmente tenham percebido que a premissa que pretendiam explorar certamente seria melhor aproveitada com o tempo de tela que somente a televisão pode oferecer. Assim, o projeto foi levado para a HBO, o oásis das séries com grandes orçamentos e altas doses de violência e sexo, dando origem aos 10 episódios desta primeira temporada.
Como eu já disse em alguns de nossos outros posts sobre séries de TV: o aumento da qualidade destas produções é uma crescente que veio para ficar. "Vinyl" utiliza uma estrutura muito semelhante à outros dramas televisivos dos anos 2000 que revolucionaram o jeito de se fazer séries na televisão: "Sopranos" e "Boardwalk Empire", da própria HBO, e "Mad Men", da AMC. Estabeleço tal comparação porque as séries citadas acima tem uma estrutura muito semelhante: o protagonismo da série é ao mesmo tempo dividido por seus personagens principais e pelo contexto que os cerca, que são sempre desenvolvidos simultaneamente. Para ver isto posto em prática, basta observar o poster de "Vinyl": o rosto de seu protagonista, Richie Finestra, e em seus óculos escuros uma banda tocando para a multidão de um show de rock. Embaixo, a tagline: He didn't see the future. He heard it (Ele não viu o futuro. Ele o ouviu). Não poderia ser mais claro do que isto.
Para que esta estrutura proposta funcione, a série precisa acima de tudo de um protagonista capaz de carregar o público e mantê-lo interessado ao longo da exibição. Alguém com personalidade forte interpretado por um excelente ator de grande carisma. A escalação de "Vinyl" para o protagonista Richie Finestra não poderia ter sido mais perfeita. Bobby Cannavale é um excelente ator, com grande experiência em séries de TV e inclusive um Emmy de melhor ator coadjuvante por sua brilhante participação como Gyp Rosetti na terceira temporada de "Boardwalk Empire", onde havia absolutamente roubado a cena. Em "Vinyl", Cannavale entrega tudo que a série precisava: um ator de grande alcance emocional, com uma interpretação enérgica e uma voz e presença física marcantes, completamente capaz de atrair a atenção do público todas as vezes em que aparece em cena. Cannavale e seu perturbado Richie Finnestra são os guias perfeitos para nos levar pelo mundo completamente maluco da série.
O primeiro episódio de "Vinyl", dirigido pelo próprio Martin Scorsese, é perfeito em estabelecer o tom e o estilo visual que a série tem durante toda essa primeira temporada. Comentar sobre a direção de Scorsese é praticamente chover no molhado. Como já deixamos claro em nosso vídeo sobre os maiores de todos os tempos, o diretor ítalo-americano é o melhor de sua área trabalhando atualmente. Inúmeros de seus filmes estão entre os melhores da história do cinema e o diretor tem a incrível capacidade de dirigir filmes que são ao mesmo tempo épicos em relação a temática retratada e extremamente intimistas com relação a seus personagens. Tudo isso aparece neste episódio, com os famosíssimos planos sequência do diretor, que conseguem conferir a ação mostrada em tela um incrível ar de credibilidade e naturalidade, por mais absurdo que o que está a acontecer seja.
Dessa forma, somos introduzidos de maneira brilhante à Richie Finestra, um dos donos de uma das maiores gravadoras americanas, American Century Records, prestes a vender sua companhia para investidores alemães para sanar seus problemas financeiros. A American Century Records é uma metáfora perfeita para o próprio cenário do rock norte-americano nos anos 1970: um titã que dá claros sinais de cansaço. Em um ato intempestuoso, Richie desiste de vender sua empresa e toma a arriscada decisão de tentar revolucioná-la, com a criação de um sublabel que visa a descoberta de algo novo. Como Richie diz a todo o tempo: é tudo sobre a música, o som, aquilo que abre uma direta porta de comunicação entre o músico e o fã. A partir disso, os problemas da companhia começam a se misturar com os problemas do empresário, dando origem a uma enorme bola de neve que o leva ao abuso de drogas. Para quem conhece minimamente a filmografia de Martin Scorsese, esta premissa é certamente familiar. E assim como os filmes do diretor, "Vinyl" consegue explorar de maneira perfeita a mistura bombástica da vida pessoal de Richie e os problemas de sua companhia, tudo agravado pelo vício.
Outro grande acerto de "Vinyl" é a decisão de seguir o caminho do sucesso estabelecido por "Mad Men": manter-se sempre próximo do personagem principal, mas sem depender em absoluto de seus arcos dramáticos. Com interessantíssimos personagens secundários, "Vinyl" não se limita e consegue explorar muito mais daquele universo que criou: com James Jagger e seu britânico Kip Stevens acompanhamos os Nasty Bits, uma banda com som e atitude agressiva, o algo diferente que Richie tanto procurava; com Devon (Olivia Wilde), acompanhamos uma ex-artista infeliz com seu casamento e com o parcial abandono de suas motivações artísticas; já em Zak Yankovich (Ray Romano) temos o homem cansado de permanecer um coadjuvante perante o explosivo e impulsivo Richie. A lista de personagens interessantes da série é infinita.
Entretanto, há outro personagem que assume total protagonismo de "Vinyl": a música. Desde a marcante abertura da série até pequenos clipes que aparecem entre algumas cenas, a imersão que "Vinyl" proporciona ao público em um ambiente musical é impecável. As trilhas sonoras são brilhantes: além de utilizar grandes sucessos que marcaram a época em que a história se passa, as letras refletem perfeitamente o que está sendo mostrado em tela. Martin Scorsese sempre acerta em cheio em suas trilhas sonoras, contando ainda com a participação de Mick Jagger, tudo é conduzido de maneira perfeita neste departamento. "Vinyl" acerta até mesmo em algo extremamente difícil de se alcançar: representações de artistas ainda vivos ou que há pouco faleceram, ainda muito presentes na memória coletiva das pessoas. As participações destes artistas são brilhantes, e certamente só o são porque conduzidas por alguém que conhece tão bem cada uma dessas pessoas como Mick Jagger. Elvis Presley, Robert Plant, Alice Cooper, David Bowie, são todos muito bem representados e suas participações sempre acrescentam algo à trama e fazem sentido dentro dela. Um bônus extremamente prazeroso de assistir e que nunca é utilizado em excesso.
Porém, nem tudo em "Vinyl" é perfeito. O episódio piloto é extremamente competente em estabelecer o que virá a seguir. Contudo, sua duração é desnecessariamente excessiva e prejudica e desbalanceia completamente o ritmo do episódio, tornando-o cansativo em vários momentos. Porém, passando-se esta primeira parte, o restante dos episódios são todos extremamente bem editados, com uma duração média de 50 minutos que nunca chega perto de parecer cansativa. O saldo geral da primeira temporada de "Vinyl" é extremamente positivo, conseguindo estabelecer um universo de situações a serem exploradas, todas muito bem costuradas em relação a temática que retrata. A experiência do cenário musical trazida por Mick Jagger, a genialidade cinematográfica de Martin Scorsese e a experiência televisiva de Terrence Winter e Rich Coen formam a combinação perfeita para criar uma das séries de televisão mais envolventes dos últimos anos. A HBO acertou em cheio novamente.
Excelente
Excelente
Por Obi-Wan
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