sábado, 14 de novembro de 2015

Festival da Bienal de Curitiba (FICBIC): breves análises


         Antes de mais nada, gostaria de dizer que lamento muito pelo pequeno número de filmes que consegui assistir no FICBIC. Por motivos da complicada rotina de faculdade, consegui ver apenas 4 filmes dos vários longas exibidos durante os nove dias de festival. Dito isso, gostaria de elogiar a iniciativa, que conseguiu trazer grandes filmes que o grande público não está acostumado a ver (me incluo nesse bolo), tanto nacionais quanto de países que escapam do eixo mercadológico mais conhecido (Estados Unidos, Inglaterra, França). Com o ingresso gratuito em todas as sessões, os filmes que assisti tiveram um bom público.
        Escolhi estes 4 filmes que comentarei nesse texto baseado pura e simplesmente baseado em meus próprios interesses, sem pensar em escrever críticas sobre esses filmes. Porém, me dei conta de que seria importante escrever pequenas considerações sobre essas obras, todas bastante diferentes das que costumam aparecer aqui no blog. Sem querer superestimar a capacidade de alcance deste post, deixo breves comentários sobre os filmes que assisti como uma forma de recomendá-los a nossos leitores.




O Tesouro (Comoara) - Romênia/Bélgica (2015). Primeiro filme que assisti no festival (no dia 06/11) e justamente o que mais gostei. "O Tesouro" é um daqueles filmes que conseguem contar uma história interessante e comovente a partir de uma premissa incrivelmente simples. Costi, aparentemente um pai de família da classe média, lê histórias de Robin Hood para seu filho antes de dormir. Em um desses momentos, seu vizinho Adrian bate a sua porta dizendo que precisa de um empréstimo para alugar um detector de metais que lhe daria a localização de um tesouro que seu avô havia escondido em uma casa da zona rural. Esse é o tipo de premissa que imaginamos para filmes mirabolantes como "A Lenda do Tesouro Perdido" e provavelmente nunca a havíamos imaginado em uma comédia independente. O incrível trabalho do roteiro de "O Tesouro" é, portanto, transformar em algo cotidiano e trivial algo que parece saído de uma das histórias de Robin Hood.
       Roteiro e direção, ambos de Corneliu Porumboiu, constroem juntos de maneira extremamente harmoniosa esse sentimento de banalidade. O filme apresenta uma trama muito contida, sem nenhuma grande reviravolta, algo que seria muito natural levando em consideração a sinopse do filme. Ao invés disso, Porumboiu prefere explorar as relações pessoais dos personagens antes mesmo do surgimento do tesouro em si, que funciona mais como um McGuffin do que como um elemento crucial da trama. Outra estratégia muito interessante adotada por "O Tesouro" está nos elementos da direção e da edição: as tomadas e cenas longas transmitem uma impressão de naturalidade, dando ao filme um aspecto muito mais teatral do que cinematográfico.       
            Por muitas vezes ao longo do filme, minha empatia foi tamanha que me esqueci que estava acompanhando uma história fictícia. Essa é a grande façanha de "O Tesouro": ser extremamente memorável e significativo sem ser grandioso ou excêntrico. O próprio final do filme é melhor do que se espera. Tudo isso me leva a um simples adjetivo que sempre associarei a esse filme: sublime.


Finsterworld - Alemanha (2013). Como se pode observar claramente pelo próprio poster, "FInsterworld" é um filme muito difícil de se encaixar em qualquer categoria ou gênero. A comparação mais fácil que sempre me vem a cabeça é com "Magnolia" (1999), pois ambos os filmes tem uma estrutura narrativa semelhante, que intercala histórias simultâneas de diferentes personagens, relacionando-as entre si no terceiro ato do filme. 
          "Finsterworld" tem alguns personagens e situações bastante clichês, como a frustada diretora que não encontra inspiração para seu novo filme e um acontecimento no final que parece ter no filme apenas uma função de chocar o público. Esta obra do cinema alemão não chega a ter o polimento e a qualidade de roteiro de "Magnolia", porém contém algumas cenas e discussões muito memoráveis, optando por uma aura existencialista que refere-se mais ao conceito de ser alemão do que ser humano.


Güeros - México (2014). Com uma direção altamente estilizada desde seus primeiros momentos, "Güeros" conta uma história aparentemente muito personalista e autoral. O filme se desenrola acompanhando a história de Federico e Tomás, em um estilo muito semelhante aos tradicionais road movies hollywoodianos, porém passado todo dentro da Cidade do México. "Güeros" se utiliza muito bem de seu cenário como um elemento vivo dentro de sua narrativa, que contribui enormemente para a construção de seus personagens. O filme usa como pano de fundo uma grande greve de estudantes de 1999 para gerar discussões muito interessantes sobre juventude e movimentos estudantis.
        Como já disse anteriormente, "Gûeros" tem uma forte assinatura de seu diretor, Alonso Ruizpalacios, que também roterizou o filme com Gibrán Portela. Um elemento da direção que me chamou muito a atenção foi a maneira como o diretor se esforça por transformar o espectador em mais um passageiro dentro da jornada, sempre acompanhando os personagens de perto. Porém, vários momentos o filme quebra a quarta parede, com uma cena dos atores discutindo o roteiro em meio a uma cena do filme e um diálogo que tira sarro da própria obra e do cinema mexicano em geral, com seus recentes "filmes em preto e branco que se pretendem artísticos". Tudo isso contribui para dar origem a uma obra cinematográfica única e memorável.


Um Pombo Pousou num Galho Refletindo Sobre a Existência (En duva satt pa en gren och funderade pa tillvaron) - Suécia (2014). Qualquer palavra minha que venha depois desse título e desse poster parecerá a coisa mais sensata e ao mesmo tempo sem graça que você já leu. Se "Finsterworld" já é difícil de abordar, "Um Pombo Pousou num Galho Refletindo Sobre a Existência" parece forçar todos os limites da compreensão humana. Numa tentativa fadada ao fracasso de encaixar o filme em parâmetros conhecidos, pode-se dizer que "Um Pombo" é um filme com um estilo visual e narrativo de alguma forma semelhante aos filmes de Wes Anderson, porém muito mais absurdo.

            Terceiro filme de uma trilogia do diretor e roteirista Roy Andersson (que também inclui "Canções do Segundo Andar (2000) e "Vocês, os vivos" (2007)), "Um Pombo" usa uma estrutura de esquetes para abordar os absurdos da vida cotidiana. O tema central que parece voltar a maioria dessas esquetes é o da indiferença, a capacidade humana de deliberadamente ignorar outros seres em vista de seus próprios interesses. Com um marcado estilo de câmera fixa e cenários extremamente semelhantes entre si, "Um Pombo" brinca com os limites da linha tênue que divide o que é considerado como absurdo e o que é visto como corriqueiro. Enfim, "Um Pombo" é um dos filmes mais subjetivos que já tive o prazer de assistir e nada do que eu possa falar chegaria perto de encapsular a experiência de se assistir este filme.

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