(The Girl on the Train)
Suspense/Mistério
Data de Estreia no Brasil: 27/10/2016
Direção: Tate Taylor
Distribuição: Universal Pictures
É difícil sair da sessão de “A Garota
no Trem” sem pensar que o longa representa uma excelente construção psicológica
de seus personagens, com momentos de rimas temáticas e interação destes que
despertam a curiosidade do espectador. Porém, também é difícil sair da sala de
projeção sem pensar que a lentidão do filme em sua construção narrativa (de
“grandes revelações”), apesar de se mostrar até que consistente em proposta,
acaba sendo uma experiência desgastante pro público que espera por duas horas
ser surpreendido, mas que consegue antecipar todos os passos dos indivíduos
presentes na narrativa – e levando em consideração que estamos falando de um
suspense/mistério é ainda mais alarmante que o resultado beire muitas vezes o
tedioso.
Esta construção psicológica complexa e
intrigante já nos fisga quando somos apresentados a nossa protagonista Rachel
(Emily Blunt), uma figura de olhos tristes e desorientados pelo vício em
álcool, que após perder o emprego e ter se divorciado de Tom (Justin Throux)
encontrou como atividade diária uma viagem de trem que passa na frente de sua
antiga residência – a qual agora é habitada por Tom ao lado de Anna (Rebecca
Ferguson) e a filha do casal -, enquanto dedica atenção também aos vizinhos
Megan (Halley Bennett) e Scott (Luke Evans), um casal que em sua aparente perfeição
romântica desperta a inveja triste de Rachel, que enxerga na união dos dois
toda a culpa e frustração dos sonhos não realizados em seu casamento.
O mais impressionante é a forma com que
os roteiristas conseguem desconstruir toda a aparente perfeição nas menores
relações dentro do filme, algo que dá um caráter cíclico nas relações abusivas
psicologicamente entre os casais presentes na película. Assim, temas são
ressaltados por atitudes e desejos das personagens femininas, que aparentam uma
eterna luta interna com suas frustrações e medos. E mesmo que o roteiro recorra
no erro de utilizar uma narração em off para apresentar certos pensamentos ocultos
das personagens, ainda assim não podemos afirmar que a proposta seja
disfuncional, ainda que medíocre do ponto de vista estrutural narrativo.
Assim, quando “A Garota no Trem” não se
entrega a abordagens clichês em sua estrutura e opta por uma linha narrativa
mais inteligente somos surpreendidos com a complexidade que praticamente todos
os personagens possuem no filme, visto que, desde Rachel até o psiquiatra
Karmal Abdic (Edgar Ramirez), os indivíduos que passam pela projeção tendem a
enfrentar decisões e tentações que os tornam mais humanos para os olhos do
espectador. Tal perspectiva nos faz com que pelo menos meramente o destino de
cada personagem nos seja relevante, algo que, ao menos em tese, proporciona um
grau de ansiedade para sabermos o resultado final da projeção.
É mesmo uma pena que ao investir em uma
proposta complexa as roteiristas (Erin Wilson e Paula Hawkins) e o diretor Tate
Taylor estejam presos na própria armadilha contemplativa que armaram, já que o
longa parece sempre se arrastar em sua primeira metade, com informações novas e
importantes sendo adicionadas por uma estrutura de tempo não linear – avançamos
dos dias atuais para alguns meses atrás, para alguns meses a frente (mas ainda
não os dias atuais), voltamos aos dias atuais e aos poucos novas informações do
passado são adicionadas de tempos em tempos com flashbacks ou retomadas de
memória. A bagunça criada pelo roteiro cria um filme de ritmo trôpego e
extremamente enfadonho, com passagens que acabam por denunciar cerca de 40
minutos antes aquilo que o filme julga uma grande revelação.
Nesse aspecto, a direção de Taylor peca
por momentos de obviedade gritante (como ao esconder o rosto de uma figura em
determinada parte da projeção) ou mesmo por estender muito diversas passagens
que ressaltam o estado de embriaguez da protagonista. Porém, quando o diretor
se concentra em ser mais discreto é inegável que o filme apresenta composições
interessantes, como no hábito constante dos personagens buscarem um olhar para
fora dos aposentos através de janelas, como que desejassem ver além da própria
angústia que permeia suas vidas, o que da uma perspectiva uníssona para a
própria motivação de Rahcel viver observando através da janela do trem em
relação aos demais indivíduos do filme – e a abordagem é ainda mais
interessante quando percebemos que nós como espectadores também somos colocados
pelo filme como voyeurs de apenas pequenas partes das vidas daqueles
personagens.
Ainda, é notável o impacto de uma rima visual que
um pequeno pingo d’água pode gerar, bem como construção de “pista e recompensa”
a partir de um pequeno objeto usado de maneira corriqueira e que ganha um
significado divertido (ainda que óbvio) para o arco dramático da personagem de
Emily Blunt – e é mesmo uma pena que o roteiro sinta a necessidade de
verbalizar tal arco na última cena do filme, sendo não só redundante, mas
também frustrante. E já que citei Blunt pela segunda vez, me vejo na obrigação
de apontar que sua performance é absolutamente espetacular, sabendo condicionar
apenas com sua linguagem corporal e olhar os diferentes estados de embriaguez
de Rachel, ainda se mostrando uma figura trágica cada vez que a narrativa
avança. Tais elogios de atuação podem ser feitos a todo o elenco que, em maior
ou menor grau, funcionam em suas propostas básicas, merecendo um destaque para
as atuações masculinas de Evans e Throux conseguem apontar as nuances e
mudanças de perspectiva de seus personagens e que se revelam vitais para a
temática maior que o filme revela (aí sim) aos poucos.
Com
os créditos finais surgindo na tela existirá no espectador certo grau de
satisfação pela abordagem inteligente da psique dos personagens, mas um
tremendo cansaço por tais aspectos estarem relacionados a uma obra extremamente
lenta, quando deveria ter apostado num pouco mais no dinamismo. Uma revisada na
estrutura do roteiro e uma direção mais concisa e inteligente (é inevitável
pensar no nome de David Fincher), “A Garota no Trem” poderia ter sido um dos
grandes filmes do ano, ao invés disso, entre um bocejo e outro, sabemos que é
apenas um bom filme de boas idéias.
Bom
Por Han Solo
Por Han Solo
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