sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Crítica: "A Criada"

A Criada
(Ah-ga-ssi)
Drama/Romance/Suspense
Data de Estreia no Brasil: 17/01/2016
Direção: Park Chan-Wook
Distribuidora: Mares Filmes



Caso não fosse a birra ridícula do júri no festival de Cannes de 2016 em não premiar os favoritos da crítica, Park Chan-Wook (realizador do excepcional "Oldboy") seria o vencedor do prêmio de melhor diretor no festival por seu trabalho neste novo longa, “A Criada”. E com todo merecimento, visto que o filme se constrói a partir da abordagem carregada de suspense e erotismo de seu diretor para contar uma história de trapaça, ambição e paixão. E se a premissa temática apresentada acima interessou o leitor, acredite, a construção dramatizada da película não só faz justiça a tais temas, como ainda sabe brincar a todo momento com a expectativa de seu público que nunca consegue prever qual será o próximo passo dos personagens.
Provando que adaptar não é simplesmente seguir passo-a-passo todos os elementos presentes na obra original, o roteiro (escrito por Wook ao lado de Chug Seo-Kyung) é uma adaptação do livro britânico de Sara Waters (famosa por abordar relações lésbicas), Fingersmith, na qual os roteiristas transportam a história de um jogo de manipulação e golpe de dois personagens em uma jovem garota e seu tio para o contexto do período de ocupação Japonesa na Coreia do Sul (1910 – 1945).Contar mais do que isso seria leviano de minha parte, já que o espectador perderia parte da maravilha do filme que é se deixar levar pela dubiedade de seus personagens que parecem sempre transitar de manipulados para manipuladores e vice-versa – E assim, o cartaz promocional original do filme, exposto acima, representa um exemplo gráfico perfeito da tentativa de todos os personagens tentarem controlar uns aos outros.
Em dinâmica complexa de personagens, as atuações de todos os atores envolvidos na obra funcionam de maneira exemplar em suas transições de inocência e malícia. É impossível terminar o filme sem reconhecer o brilhantismo das performances de Kim Min-hee como a Lady Hideko e Kim Tae-ri como Sook-Hee que se entregam completamente em cena desde uma leve tensão sexual, até mesmo em suas cenas de sexo mais explícitas. Merecem aplausos também Jo Jin-woong que concebe o tio de Hideko com um ar de mistério, revelando aos poucos seu proposito na narrativa, e principalmente a performance urgente de Ha Jung-woo como o falso Conde Fujiwara, que consegue soar imponente e patético sempre que necessário.
Construindo ainda um ar de leveza (paradoxalmente, dentro de um thriller) e elegância em sua ambientação, Ásia e Europa se fundem desde a trilha sonora de Yeong-wook Jo – que constrói uma melodia que remete a clássicos como Bach e Mozard a partir de dedilhados em instrumentos de corda – até mesmo em seus figurinos e penteados belos e bem construídos. Assim, a Direção de Arte brilha justamente em sua construção da propriedade principal onde o filme se passa, misturando de forma crível edificações vitorianas e edificações típicas japonesas, sendo que Chan-Wook parece mudar a forma com que enquadra os aposentos da propriedade a partir da perspectiva de cada personagem.
A direção de Chan-Wook é algo que claramente engrandece e muito a narrativa, com o sul-coreano sabendo balancear bem todos os elementos e motivações que impulsionam a estória, dando um tratamento delicado e poderoso ao abordar o erotismo - Digamos que se estabelece na cenas de sexo a intensidade apaixonada de um "Azul é a Cor Mais Quente" com a doçura terna de "Carol". Somente ao final da projeção é que o filme quase se desestabiliza (seus 5 minutos finais), quando o diretor quase cai numa objetificação ou mesmo num tom apelativo. Ainda assim, é inegável o controle narrativo do cineasta que aparenta mostrar para a plateia apenas o que cabe aos propósitos do filme, seja em questão da violência ou nas sequencias de sexo (é assim que se faz, Nicolas Widing Refn!)
O que nos leva a outro elemento de destaque na produção que é a montagem afiada de Kim Jae-Bum e Kim Sang-beom, com a dupla alcançando a façanha de depositar muita energia em um filme de duas horas e meia (que passam voando, diga-se de passagem), além de conseguirem sempre apresentar novas informações para cada seguimento envolvendo atitudes, reações e objetos, sem jamais soar repetitivo mesmo que reprisemos múltiplas vezes passagens específicas da estória sobre perspectivas distintas de cada personagens. Isto é digno de nota, já que fica em sintonia perfeita com a forma com que o roteiro investe em sua divisão, com cada segmento sendo narrado por um personagem diferente, algo tão bem feito que consegue até mesmo fazer com que a sempre questionada "Narração em off" funcione de forma orgânica, ainda que pontual.
Contando ainda com uma fotografia esplendorosa de Chung Chung-hoon, que transita entre tons frios e quentes para representar melancolia e uma entrega a nossas paixões mais intensas, "A Criada" não merecia somente o prêmio de melhor direção em Cannes esse ano, mas se fosse um filme feito em um grande estúdio de Hollywood (embora eu duvide que algum teria a coragem dos realizadores neste projeto) certamente seria indicado nas principais categorias do Oscar. Nos resta apenas torcer para que ao menos entre nas categorias técnicas. Mesmo que isso seja pouco, vai ser um pingo de justiça para aquele que é facilmente um dos melhores filmes do ano.






Excelente

Por Han Solo

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