quarta-feira, 1 de abril de 2015

Crítica: "Vício Inerente"

Vício Inerente
(Inherent Vice)
Drama/Mistério/Policial - 2014 (Estados Unidos)
Data de Estreia no Brasil: 26/03/2015
Direção: Paul Thomas Anderson
Distribuidora: Warner Bros



Algumas das palavras que saem com maior prazer da boca de um cinéfilo são “eu nunca vi isso antes!”. Aconteceu algumas vezes como quando vi Quero ser John Malkovich, ou ao final de 2001: Uma Odisseia no Espaço, além do momento final de Magnólia. São momentos raros, porém que marcam definitivamente a vida de um cinéfilo, pois tais reações de perplexidade e estranhamento são típicos de filmes amados e/ou odiados pelo publico geral e sendo assim, deixam o filme longe de qualquer forma de esquecimento. Eis que Paul Thomas Anderson atingiu admiravelmente este resultado com o seu novo longa Vício Inerente, uma obra tão particular que mesmo funcionando como a soma de filmes como Big Lebowski e Chinatown, ainda se mostra inventiva e de certa forma original.

O filme dá muito espaço para o desenvolvimento de seus personagens e do clima de tensão, medo, curiosidade e principalmente a paranoia (já volto neste item) do que em sua história que se desenrola de forma atrapalhada com dezenas de personagens coadjuvantes e histórias paralelas, o que pode levar a grande das pessoas para fora da sessão pensando que o filme foi ruim por não terem conseguido acompanhar o andamento da história. Para todos eu repito, este filme não está focado em sua trama de mistério, o grande foco da história está na criação de uma ambientação magnífica do mundo que o personagem Doc. Sportello (Joaquin Phoenix) e de toda a confusão massiva que representa a sua mente.
Sportello é um detetive particular que literalmente simplesmente vive a sua vida a base de muita maconha até o momento em que sua ex-namorada Shasta vem lhe pedir ajuda lhe contando um plano da mulher de seu amante, e do amante desta, para sumir com Mickey Wolfmann gerando uma série de eventos e sub tramas que realmente não fazem diferença serem especificadas aqui. Basta se ter a noção de que o material base do romance de Thomas Pynchon é tão rico em ambientação e criação de seus personagens confusos e ambíguos que é um prazer (quase sempre)presenciar seus diálogos muito fielmente adaptados para o filme.
O tom “onírico” e “chapado” do filme são os seus motores. Tudo se encaixa nessa atmosfera, desde o ritmo do filme, o jogo de luz e sombras (numa construção Noir interessantíssima), a trilha sonora com clássicos dos anos 60 e 70 sem ser composta por músicas óbvias, e as atuações que são fantásticas, merecendo um destaque Joaquin Phoenix que está absolutamente perfeito no papel principal ,sendo um parceiro perfeito para o “Dude” de Jeff Bridges, e Katherine Waterston que funciona numa variação de “femme fatale” digna de nota. O restante do elenco está todo muito afinado e todos os personagens (e olha, são muitos) têm seus momentos.
Vendo tantos elementos presentes num mesmo filme é fácil imaginar que este entraria em colapso, o que chega muito perto de acontecer, mesmo, porém a mão controlada do brilhante diretor Paul Thomas Anderson (um dos melhores da atualidade e particularmente um dos meus favoritos de uma forma geral) é o que mantem este filme deliberadamente confuso, porém muito bem construído. O diretor, que também assina o roteiro, utiliza dos seus já famosos takes longos e faz uma bela composição e administração de seus planos, fazendo com que tematicamente estes elementos adicionem à narrativa em um dos pontos mais fortes do filme que é o embate entre uma classe social padrão burguesa e uma onda hippie da década de 70, sendo assim o personagem de Josh Brolin, Big-Foot, tematicamente perfeito assim como a já antológica cena de um jantar de pizza reencenando a santa ceia. Tal cena é breve e trabalha de forma memorável a transformação “contra-cultural” de um elemento puramente conservador.
O que nos leva aquele que considero ser o elemento “atmosférico” mais importante para a narrativa, a paranoia. Seja esta criada pelo efeito das drogas, da perseguição policial ou pela própria sociedade (e a cena do filme anticomunista no manicômio é perfeita por isso), a paranoia está sempre nas cenas mesmo que colocada de forma sutil, seja por um plano mais claustrofóbico, pelos diálogos ou por figurantes que se repetem em situações especificas. A paranoia está tanto na forma com que os eventos da narrativa se resolvem quanto nos elementos ambíguos citados no parágrafo acima, chegando ainda a gerar uma falta de confiança do espectador de se tudo aquilo que Doc. vê é realmente o que está acontecendo já que eventos e imagens parecem se confundir em sua visão sem qualquer mudança de linguagem do filme.


Mesmo sendo um tanto quanto indulgente demais e exagere em sua duração, Vício Inerente é sem dúvida nenhuma uma experiência diferente de qualquer outra no cinema. Não sei se isso fará com que você goste mais ou menos do filme, posso imaginar algumas pessoas abandonando-o no meio da história, mas é inegável a sua auto compreensão de confusão e de que ao chegar aos créditos finais eu estava com um sorriso (cansado, é verdade) no rosto e simplesmente pensei: “Eu nunca vi isso antes!”. 








Ótimo

Por: Han Solo

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