Montar
uma lista ao final de todo ano elencando os melhores filmes lançados é tradição
de qualquer canal da internet voltado à análise da produção cinematográfica.
Nós do História em 35mm já produzimos a nossa com os melhores do ano passado, numa tentativa de análise breve e de caráter recomendativo daqueles que
consideramos grandes destaques de 2014. Porém, reunir títulos diversos,
descartar muitos em nome de um “top 10”, e ignorar grandes lançamentos por sua
chegada tardia aqui no Brasil (Her, O Lobo de Wall Street e 12 Anos de
Escravidão são alguns exemplos) tornam tudo incompleto e menos interessante do
ponto de vista de abranger o que encontramos de melhor em nossas idas ao
cinema.
Pensando
nisso, aqui está uma relação de dez filmes que julgamos como os nossos
favoritos lançados até a primeira metade do ano de 2015. Dessa forma, podemos
colocar filmes que só chegaram aqui para a corrida ao Oscar, sem a preocupação
de não incluí-los em nossa lista final com o fechamento do ano. Sim, ainda se
torna uma forma de “Top 10”, porem, o intuito de tal lista é apresentar os que
consideramos em nossa opinião os mais interessantes e “importantes”, não
listá-los em uma escala de qual é melhor que o outro (embora, sim, tenhamos
nossos favoritos). E é por isso que vamos organizar os filmes nessa lista por sua data de lançamento nos cinemas brasileiros.
Whiplash (Damien Chazelle) – Na tela escura os primeiros compassos de bateria são tocados para chamar a atenção da platéia. A partir de batidas mais lentas que gradualmente se transformam, o diretor de Whiplash já cria o silêncio da platéia para nos apresentar a cena que mais se “repete” ao longo do filme: o jovem Andrew Neiman praticando incansavelmente cada técnica de seu instrumento. Estes dois primeiros elementos que cito dos segundos iniciais de filme são essenciais para a história. O silêncio causado na platéia está exigindo não só um “me veja”, mas sim “me escute”, “preste atenção”, para que assim o filme te fisgue e te leve no ritmo que este deseja. Com uma montagem brilhante e um roteiro que só tropeça um pouco no fim do segundo ato (quando um acontecimento inesperado pode soar forçado para a maioria), Whiplash é sem dúvida alguma uma experiência atípica para todos aqueles que dediquem seu tempo a este filme, perfeitamente orquestrado por Damen Chazale.
Crítica do História em 35mm: Whiplash
Foxcatcher (Bennett Miller) – Com toda certeza este é o segundo filme que mais trabalhou em questão de ambientação para obter resultados tão espetaculares (ficando atrás apenas de Vício Inerente). O angustiante clima de tensão e tragédia já prevista que se instaura durante todo o filme, construído de forma elegante, minimalista e sutil por Bennett Miller, é frio em sua fotografia e enquadramentos abertos que se contrapõe aos close ups, funcionando tanto num comentário interessante da produção e descarte de atletas nos Estados Unidos, quanto um drama intimista de cobiça, raiva e loucura. Se Mark Rufalo comprova mais uma vez seu status de grande ator, Steve Carrel e Channing Tatun surpreendem em suas composições complexas, sendo a atuação do comediante tão fantástica por sua expressividade corporal e facial embaixo de maquiagem pesada.
Crítica do História em 35mm: Foxcatcher
"Birdman" (Alejandro González Iñarritú) - Justíssimo vencedor na categoria de Melhor Filme do Oscar de 2014, "Birdman" é um filme excepcional que trata, em vários sentidos, e todos de maneira brilhante, sobre a tênue linha entre ficção e realidade. Para isso, o roteiro explora a mente de seu personagem principal, Riggan, enquanto ele tenta retomar seus dias de glória estrelando um musical na Broadway. O principal mérito de "Birdman" é estudar a mente de Riggan de maneira tão forte e competente, que passamos o filme inteiro nos questionando sobre o que faz parte da "realidade" e o que não é mais do que imaginação. Perfeito em praticamente todos os aspectos, "Birdman" é um filme marcante e criativo, que certamente permanecerá por muito tempo na memória coletiva dos cinéfilos.
Crítica do História em 35mm: Birdman
Selma (Ava DuVernay) – Um drama extremamente poderoso que conta com uma das melhores atuações do ano e também um dos melhores trabalhos de direção. Não é simplório, unilateral, raso ou uma hagiografia. Não! Selma é um filme que sabe emocionar em seus enquadramentos, momentos tocantes de drama e trilha sonora impecável, sem que com isso fique caindo no melodrama pedindo para que compartilhemos uma lágrima fácil. O filme ainda é eficiente em sua apresentação e contextualização histórica, fazendo com que o envolvimento do espectador aconteça de forma crescente. Este belo filme, que foi solenemente ignorado no Brasil e infelizmente bombardeado de críticas por Harvey Weinstein em sua campanha para desbancar qualquer drama poderoso que pudesse despontar como grande favorito das premiações, é um drama que ecoa ironicamente em tantos aspectos sociais da atualidade.
Crítica do História em 35mm: Selma
Kingsman (Matthew Vaughn) – Ao escrever sobre “Os Caçadores da Arca Perdida” salientei o aspecto de homenagem e, de certa forma, paródia que o filme adotava para com os filmes de aventura B das décadas de 30 e 40. Kingsman é uma versão atualizada de tal revisão, só que voltada para os filmes de espionagem (principalmente os da série 007). Com cenas de ação tão bem orquestradas e executadas em nome do puro entretenimento, Kingsman não mede esforços para tentar agradar um público que se incomode com quantidades massivas de sangue. O filme sabe muito bem o que é, conduz tudo com um bom humor e só tropeça de vez em quando (muito de vez em quando) por apostar demais as vezes no humor referencial direto a James Bond, quando é a sutileza e a forma orgânica de suas referências que rendem os melhores momentos do filme. E que grande filme!
Crítica do História em 35mm: Kingsman
Blind (Eskil Vogt) – Se Whiplash tem uma montagem brilhante que trabalha de forma magnífica com os movimentos executados pelos músicos, Blind é uma obra prima da montagem, tão espetacular e única é a forma com que este belo filme Norueguês contrapõe suas cenas a partir deste artifício e da edição. Narrado por uma personagem que tornou-se cega, Blind se enquadra perfeitamente na categoria de filmes “Eu nunca vi isso antes”, por administrar tão bem planos e sequencias puramente “implausíveis” na realidade por estes se apresentarem a partir da mente de uma pessoa que conheceu o mundo por seus olhos e que hoje não possui mais noções espaciais compatíveis com aqueles que ainda possuem o sentido da visão. Um drama introspectivo e que gera questionamentos existências, Blind é sem dúvida alguma um dos trabalhos mais maravilhosos que já tive o prazer de testemunhar.
Vício Inerente (Paul Thomas Anderson) - Mais um conceito extremamente original do genial Paul Thomas Anderson, "Vício Inerente" é perfeito no que se propõe a fazer: causar o estranhamento. Como brilhantemente observado na crítica de Han Solo, o arco do personagem principal do filme, Doc Sportello, funciona como uma espécie de crossover entre as maluquices e esquisitices de "The Dude" de "Big Lebowski", com a trama extremamente complexa e neo noir de "Chinatown". Parece absurdo dizer que isso funciona, mas o enorme talento de roteirista de Paul Thomas Anderson consegue pegar essa mistura maluca e transformá-la em um ótimo e intrigante filme, que me manteve o tempo inteiro focado em tentar entender o que estava acontecendo dentro de sua trama, transmitindo assim, de maneira perfeita, o ambiente de confusão que envolve a mente de "Doc" e o seu estilo de vida hippie dos anos 70.
Crítica do História em 35mm: Vício Inerente
Frank (Leonard Abrahamson) - Meu interesse por "Frank" surgiu após observar a alta posição que o filme ocupou na lista de Han Solo sobre os melhores filmes de 2014. Após assistir o filme, não só entendi o porquê, como também admito que se o tivesse assistido antes, "Frank" também estaria na minha lista de melhores filmes de 2014. Digo isso pois o filme independente britânico consegue explorar de maneira genial algo muito difícil de se compreender e falar sobre: a inspiração artística. A partir das semelhanças, e principalmente as diferenças, entre seus dois personagens principais, Jon Burroughs e Frank, o roteiro explora de maneira brilhante o tema. Jon, um fã de música que luta para conseguir criar uma simples composição, vai aos poucos descobrindo e aceitando o porquê dessa sua falta de inspiração. Por outro lado, o esquizofrênico Frank consegue com enorme facilidade fazer música com literalmente qualquer situação. Como bem dito pelo filme, ninguém pode ser como Frank, pois há somente um Frank.
Crítica do História em 35mm: Frank
Mad Max (George Miller) – Esta ópera em forma de épico trabalhada minuciosamente no gênero de ação já nasceu com status de atingir rapidamente o patamar de “Jovem Clássico”. Subvertendo elementos característicos, com uma premissa simples, porém de carga emocional colossal na apresentação de seus personagens, seus dramas, e, claro, as maravilhosas cenas de ação em que estes se envolvem, esta pérola em forma de filme é uma viagem tão imaginativa por parte do veterano diretor George Miller que se torna irremediavelmente penetrante na memória do espectador, que é bombardeado pela maravilha visual da poeira do deserto e pela dramática da busca de redenção de nossos personagens. Arrancando “mimimis” de todos os “machinhos” que encheram a internet para reclamar das subversões dos filmes de “machões”, este excelente filme pertence a Furiosa (numa interpretação impecável de Charlize Theron). Não sendo só a estrela do sucesso comercial e de crítica que é este filme, mas também do cinema atual. Não há como medir palavras para aquele que é sem duvida “o melhor filme de ação do século XXI”.
Crítica do História em 35mm: Mad Max
Divertida Mente (Pete Docter, Ronaldo Del Carmen) - Lançado nos cinemas há menos de um mês, "Divertida Mente" já pode tranquilamente ser inserido naquele seleto hall de obras-primas cinematográficas produzidas pela Pixar. Assim como as outras geniais animações do estúdio, "Divertida Mente" traz excelentes reflexões tanto para crianças quanto para adultos, conseguindo desenvolver a rara técnica de se utilizar de símbolos e metáforas para tornar tudo mais compreensível para um público mais jovem, sem banalizar ou didatizar demais as coisas. Me lembro de ter amado assistir Toy Story quando criança e continuo adorando o filme até hoje, pois consigo compreender muito mais coisas do que conseguia entender com meu cérebro de criança. Tenho certeza que o mesmo ocorrerá com as crianças que estão assistindo "Divertida Mente" hoje e ficarão abismadas com a complexidade que encontrarão no que antes conseguiam enxergar com enorme simplicidade.
Crítica do História em 35mm: Divertida Mente
Por enquanto é isso. Lembramos que essa é uma lista que
engloba apenas os melhores filmes do primeiro semestre de 2015, ano que ainda
reserva muitos grandes lançamentos. Certamente
falaremos deles e dos filmes contidos nessa lista em um top 10 que escreveremos
no final do ano.
Nenhum comentário:
Postar um comentário