quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Crítica: "Sing Street"

Sing Street
Data de Estréia no Brasil: sem previsão
Distribuição: Weinstein Company, The
Direção: John Carney


       Cinema + música costuma ser uma combinação artística infalível. Não somente porque há verdadeiras obras de arte em forma de videoclipes, ou porque as trilhas sonoras são partes essenciais de um filme: basta uma rápida busca para encontrar uma enorme quantidade de excelentes filmes cujo tema principal é a música e seus intérpretes. "Sing Street" é o mais recente deles. Utilizando como pano de fundo uma Irlanda afundada em depressão econômica, a trama se passa na Dublin do ano de 1985. "Sing Street" acompanha Conor, um garoto de 15 anos que vive em meio as constantes brigas de seus pais e os conselhos filosóficos de seu irmão mais velho. Com a queda da renda de sua família, Conor é obrigado a mudar de escola, enfrentando uma série de dificuldades de adaptação e por fim se apaixonando por Raphina, uma misteriosa garota que mora em um orfanato do outro lado da rua. Conor a convida para participar de um vídeo de sua banda (que não existe). É este o principal impulso necessário para que o garoto aspirante a músico passe a buscar outros colegas para formar uma banda.

          O principal acerto e qualidade de "Sing Street" provém da compreensão por parte de seu diretor e roteirista, John Carney, de que independente da premissa, não há uma boa história sem bons personagens. Dessa maneira, a narrativa de seu filme é completamente orientada a partir de seus personagens. Há a forte sensação a todos os momentos que são suas escolhas que influenciam e movem a história, e não o contrário. O filme explora de maneira brilhante a personalidade de seu protagonista, Conor, fazendo com que seja muito fácil para o público sentir grande empatia por sua história e conectar as letras que escreve e sua expressão musical com sua experiência de vida, num processo de influência mútua. Se sua paixão e relação com Raphina influenciam diretamente a música de sua banda, esta também influencia, por exemplo, sua aparência e forma comportamento.
          É impressionante o número de dinâmicas bem construídas contidas dentro de "Sing Street". A partir de excelentes personagens e atuações muito competentes o filme consegue superar qualquer tipo de pensamento simplista, transmitindo uma forte sensação de complexidade em 90% do que se propõe a fazer. Além de ser um estudo sobre a música, é também uma reflexão sobre a sua principal fonte de inspiração, a partir da vida de personagens cheios de camadas. É impressionante como grande parte deles tem uma personalidade bem desenvolvida, fugindo da função de meros instrumentos de roteiro. O irmão mais velho de Conor é o principal exemplo disso. Em praticamente qualquer outro filme ele seria apenas uma muleta que o roteiro utiliza para orientar e inserir Conor no mundo da música, mas aqui ele ganha uma personalidade extremamente viva, com suas dúvidas e aspirações, contribuindo muito para a construção da trama.
            A relação entre Raphina e Conor é também muito bem explorada, sem que ela seja apenas o interesse amoroso sem personalidade que grande parte dos filmes insistem em relegar à figura da protagonista feminina. A dinâmica da banda que leva o título do filme é também incrivelmente bem construída, com os atores compensando sua falta de experiência em se tratando de cinema com uma enorme qualidade enquanto músicos, me levando a acreditar piamente até o fim que Sing Street era uma banda real (não é). A relação entre Ferdia Walsh-Peelo (Conor) e Mark McKenna (Eamon) como principais compositores da banda é muito bem feita e parece extremamente natural em todos os momentos. A direção de John Carney é também primorosa, encaixando perfeitamente com o tom e proposta do filme, utilizando-se constantemente de uma câmera na mão e muita movimentação, conferindo ao filme um estilo semelhante aos videoclipes que cita e um feeling de improvisação, assim como tudo que cerca a Sing Street.
         É claro que, apesar de todas as suas qualidades, "Sing Street" não é um filme perfeito. O filme perde muito de seu ritmo e tom no segundo ato, ficando um pouco arrastado neste momento. Acredito também que o roteiro faz uma utilização um tanto precária do elemento do bullying, com escolhas que soam bastante forçadas e um pouco simplistas em relação ao restante do filme. No entanto, nada tira de "Sing Street" sua posição entre alguns dos melhores filmes recentes cuja temática principal é música, ficando lado a lado com filmes excelentes como "Inside Llewyn Davis" (2013), "Frank" (2015) e até mesmo "Quase Famosos" (2000). Em um ano que já nos apresentou tantas decepções, "Sing Street" é extremamente bem-vindo, um filme independente de inquestionável qualidade que certamente guarda um lugar dentre os melhores de 2016 até o momento.


Excelente

Por Obi-Wan

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