Drama/Animação
Data de Estreia no Brasil: 28/01/2016
Direção: Charlie Kaufman e Duke Jhonson
Distribuição: Paramount Pictures
Anomalia:
sf 1.
Irregularidade 2. Aberração
Não
é difícil perceber que a carreira de Charlie Kaufman é uma anomalia dentro da
industria cinematográfica (e digo isso no melhor sentido da palavra). Dono de
uma filmografia exemplar e cheia de nuances existencialistas, Kaufman é o tipo
de roteirista que não escreve filmes a toa, algo cada vez mais raro no meio.
Seja pela metalinguagem dentro de “Adaptação” ou mesmo da bela melancolia de “O
Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”, os filmes do agora também diretor
(função que também desempenhava no brilhante “Sinédoque Nova York”) são obras
de arte profundamente humanistas e delicadas em sua brutalidade ao estudar os maiores
sentimentos da nossa espécie.
Assim,
seu novo trabalho “Anomalisa” é tanto um típico filme Kaufmaniano como também sua própria anomalia dentro da filmografia
do roteirista, por ser um Stop Motion diferente de tudo o que a industria
produz (sendo a primeira animação de Kaufman), mas por carregar também todas as
características já marcas registradas do diretor em seu enredo simples: Michael
Stone (David Thewlis) vive em um mundo onde a apatia e aparente depressão o
isolou dos prazeres mínimos da vida. Ao fazer uma viagem de negócios, Michael
conhece Lisa (Jennifer Jason Leigh) uma garota dolorosamente insegura que
parece ser a única voz diferente na vida de Michael.
E
quando digo que esta é a única voz que se destaca na vida do protagonista, digo
isso literalmente já que todos os personagens, incluindo mulheres e crianças, são
dublados por Tom Noonan. Aliás, este é um dos muitos pontos de puro
brilhantismo e simplicidade que o filme guarda para o espectador, já que ao colocar
um único dublador para todos os demais personagens coadjuvantes o filme
consegue realçar a apatia e desinteresse que assola Michael, fazendo com que o
espectador possa se emocionar com o simples fato de ouvir uma voz diferenciada.
E
que belo trabalho de voz que Leigh faz ao dar vida a sofrida Lisa. Dona de uma auto-estima
quase inexistente e de uma simpatia que nos atinge de imediato, Lisa é uma
personagem que quando surge em cena nos faz acreditar que estará ali para
representar uma mudança concreta na vida de Michal (e o trabalho dos dubladores
é perfeito para que nos façam torcer por tal mudança). Contudo, a “Anoma Lisa”
não é meramente uma personagem de apoio, possuindo seu próprio arco dramático
que fecha perfeitamente a narrativa, além de protagonizar um dos momentos mais
belos que pude assistir numa cena na qual a personagem canta uma determinada
música pop.
Mas por
mais que a narrativa sofra uma guinada considerável com a entrada de Lisa, são
mesmo as dores e angustias de Michael que representam o centro de debate máximo
e maravilhoso dentro do filme. Fumante compulsivo e isolado emocionalmente do
resto do mundo, o protagonista é um homem de meia idade que se vê frustrado com
o a vida mesmo sendo um sucesso naquilo que faz. O filme faz um trabalho impecável
na construção emocional do personagem fazendo com que nos importemos com este
mesmo que (e aqui entra a minha subjetividade na interpretação do protagonista)
Michael Stone seja o culpado pela própria transformação nas pessoas que o
cercam, algo que casa perfeitamente com seu sobrenome de “rocha” ou “pedra”,
não por sua postura rígida, mas por estar sempre parado no mesmo lugar, preso numa
mesma posição.
Assim,
o nome do hotel que este se hospeda, “Fregoli”, faz alusão a um mal psicológico
que pode dar novos contornos a personalidade de Michael – e pretendo não revelar
tal significado desse mal psicológico para que não interfira na experiência de
ninguém. Mas o filme não reserva só ótimas metáforas temáticas, como também
visuais: a fotografia que se altera para cores mais quentes a partir da chegada
de Lisa, bem como o contraste entre os sentimentos puramente humanos e as
linhas visíveis das peças que dão expressão aos bonecos da animação em stop
motion, além dos corpos dos personagens não surgirem como "perfeitos"/artificiais (possuindo cicatrizes e "barriguinhas"), são elementos simples que contribuem imensamente para os simbolismos do
filme.
Dirigido
com brilhantismo por Kaufman e Duke Jhonson (que também havia dirigido o
episódio em stop motion da série Community), “Anomalisa” é certamente uma das
obras mais inspiradas e belas que o cinema pode proporcionar mesmo que com seus
curtos 90 minutos, o filme consegue ainda nos dar uma das cenas de sexo mais
realistas que o cinema já produziu e estamos falando de uma animação
(certamente não voltada para o público infantil). “Anomalisa” é intenso e belo
com um nível de qualidade anômalo para o cinema moderno, mas perfeito na
filmografia do gênio Charlie Kaufman.
EXCELENTE
POR HAN SOLO
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