Os Oito Odiados
(The Hateful Height)
Comédia/Drama/Faroeste/Mistério
Data de Estreia no Brasil: 07/01/2016
Direção: Quentin Tarantino
Distribuidora: Diamond Pictures
EXCELENTE
Normalmente a “nota” colocada por estrelas da morte se situa após a crítica escrita para que, após uma leitura dos diversos aspectos abordados por quem a escreve, o leitor possa criar em sua cabeça o debate com os argumentos expressos no textos (tendo uma vez assistido ao filme) ou traçar uma leitura lógica que o faz ter sua própria ideia de qual seria a nota para aquele filme, levando a comparar com as estrelas da morte que encontra no fim da página. Mas creio que dessa vez o exercício que proponho deva ser diferente para que o leitor possa organizar os pensamentos da mesma forma que eu organizei ao sair do cinema: após três horas carregadas de simbolismos e do mais puro cinema, eu tinha a perfeita convicção de que este era um excelente filme, mas os motivos estavam muito fragmentados em meus pensamentos. Todos os pontos que sempre analiso estavam preenchidos em meu cérebro, mas eu precisava organizá-los de uma maneira lógica para expô-los.
Assim,
convido-os a leitura de meu próprio exercício mental no qual eu apresentarei 8 motivos
pelo qual “Os Oito Odiados” é um excelente filme.
1) Quentin
Tarantino:
Assim como existem o Drama, a Comédia e o Terror, Quentin
Tarantino parece possuir seu próprio gênero cinematográfico no qual certas
características se sobressaem e, quando empregadas na sincronia perfeita,
acabam por gerar experiências formidáveis. Dono de uma direção extremamente
elegante e estilosa, seu novo filme não foge das marcas registradas do
cineasta. Possuímos os longos takes já característicos do diretor, sua violência
estilizada utilizada como alívio cômico em muitos momentos, planos plongées (câmera
posicionada do alto) que seguem determinados personagens, Split Focus e os
famosos travellings circulares do diretor. Ao incluí-lo em nossa lista dos 10 maiores diretores de todos os tempos, argumentávamos quanto ao caráter autoral
deste, com seu estilo próprio divertido e inventivo. Aqui isso fica ainda mais
claro.
2)Roteiro/Diálogos
Também assinado pelo próprio Tarantino, o roteiro de “Os
Oito Odiados” tem o desejo megalomaníaco de grandes obras de Sergio Leone (como
o clássico “Três Homens em Conflito”), sendo patente a influência que este
diretor exerce no cineasta norte americano. Trabalhando a partir de uma estruturação
por capítulos, o roteiro parece saber exatamente o que quer contar e, assim,
também se dá ao luxo de poder construir seus personagens aos poucos durante as
quase três horas de projeção. Aqui você também encontra outra maçar registrada
do cineasta usada ao seu extremo, seus diálogos, já que estes cumprem bem a
tarefa alegórica do ato de se contar uma história, dão detalhes sobre o mundo
no qual os personagens vivem, além de, é claro, serem carregados com a
linguagem e precisão que só o diretor de Pulp Fiction saberia escrever.
3)Atuações
Com um material e direção tão sólidos, o elenco da
película ganha possibilidades de brilhar na tela a cada cena, sendo que cada
personagem tem pelo menos um bom momento. Presos numa nevasca dentro de uma
cabana (e não, não pretendo dar qualquer informação sobre o plot básico além
desta, já que a exposição dos diálogos de Tarantino são fundamentais para o
andar da narrativa), oito indivíduos vão demonstrando as suas verdadeiras
facetas a medida que a tensão cresce dentro da cabana.
Mas destaco que encontramos aqui um dos melhores
trabalhos de atuação de Samuel L. Jaksson que, principalmente em uma cena
específica, rouba o filme com a complexa interpretação que dá ao seu
personagem, sendo que uma indicação ao Oscar para o ator seria mais que
merecida. Não menos espetaculares estão Kurt Russel e Jennifer Jason Leigh,
pois se o primeiro impressiona com sua crueldade que se relaciona diretamente
com o fato de estar sempre desconfiado, Leigh faz uma performance espetacular
no tom descontraído, malicioso e na força de sua personagem. Ainda assim, volto a frisar como que estas são
atuações que destaco dentre tantas outras que são perfeitas.
4)Direção
de arte
Passado quase que inteiramente dentro de um único local,
a direção de arte se mostra fundamental para ajudar na criação do clima de
tensão proposto por Tarantino a partir da claustrofobia. Notem desde o
posicionamento torto de certas tábuas, como também buracos no telhado, além da
organização geográfica do loca, que logo se terá uma idéia das sutilezas que o
filme guarda para que o subjetivo do expectador não pare um minuto.
5) Fotografia
Rodado a partir do uso de filmes 70 mm, ironicamente o
filme não apela para grandes paisagens como é de costume. Tal decisão estética
se faz jus em pontos chaves de cenas no qual a atitude de um personagem no
centro do quadro pode gerar reações diferentes em personagens nas bordas mais
extremas da tela. Com um uso magistral da iluminação que parece vir de fora da
cabana, e ainda fotografado com certa “sensibilidade” a esta, a fotografia do
filme coopera com a narrativa com delicadeza em meio ao caos visceral dos
filmes de Tarantino.
6)Trilha
sonora
Mas nem todo aspecto que merece destaque é visual. A
trilha sonora do gênio Ennio Morricone aposta também (acertou!) no clima de
tensão ao invés de apelar para qualquer tema genérico que remetesse diretamente
à algum Western. A sequencia inicial dos créditos é uma coisa belíssima de se
presenciar devido a sua carga sensorial que a música traz. Além disso, o filme
ainda está cheio, como é costume na filmografia do cineasta, de uma porção de
músicas escolhidas a dedo para cada momento, contando ainda com uma utilização
de “Noite Feliz” que eu não havia visto ainda.
7)Homenagem
ao cinema
Mas porque seria tão importante Morricone evitar tal
referência genérica? Simples, os filmes de Quentin Tarantino sempre são sobre
um assunto: o amor deste pelo cinema. Assim, as referências e homenagens que o
diretor faz estão nas sutilezas seja pelo título que remete a Fellini, ter Kurt
Russel preso num inferno gelado como em “O Enigma de Outro Mundo”, a direção
que remete a Hitchcock e Brian de Palma... Tudo é uma carta aberta não só ao
cinema em seu visual (e basta ter lido o restante da crítica para perceber como
os aspectos técnicos remetem bem a isso) como também a sua função principal que é contar
uma história
8)CONTEM
SPOILERS: Estudo sobre o ato de contar uma história
É sintomático que todos os personagens estejam sempre
contando história de caráter dúbio ao longo da narrativa. Seja pela história da
carta de Lincoln, da morte agonizante do filho do General Smithers ou até mesmo
na insistência de todos duvidarem de Chris Mannix ser o novo xerife da cidade,
todos os acontecimentos giram em torno de história possivelmente/provavelmente
inventadas, mas que possuem o potencial de impacto a cada um dos indivíduos.
E não é exatamente assim que o cinema funciona?
Não procuramos histórias contadas em uma determinada
ordem, formuladas por roteiros para que estes nos fisguem em seus detalhes (até
mesmo os “baseados em fatos reais”)?
A
manipulação de emoções a partir daquilo que é uma mentira factível faz a
ligação completa da homenagem ao cinema que tanto encontramos na obra do
diretor. Chegando ao ápice exatamente no clímax final do filme quando Daisy
afirma que existe um bando a mais que irá salva-la, numa ameaça direta a Mannix
mesmo que seja feita num tom de aparente barganha. Naquele momento o roteirista
amarra as pontas, tematicamente pelo menos já que a história nunca se resolve
como verdadeira ou não, daquilo que este vinha ressaltando nas histórias
contadas dentro de sua própria história.
É...
Realmente este é um excelente filme!
Por: Han Solo
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